As dez mais vips do morro
Paulo Mendes Campos
Teodoro Enguiço, colunista social dos morros cariocas, embora meio atrasado, fez chegar até nós a sua lista das VIPs de 1963. Ei-la:
ROSINHA BOCA DE FOGO É MEIO DA ARTE – Castiga uma cuíca. A que mais recebeu o ano todo. Entrou mais homem na sua casa do que no Pronto-Socorro. Não nega também o nome que botaram nela: beber de com força está ali. Só foi em cana uma vez. Recebeu até gente lá de baixo, um dizendo que era candidato. Vai ter classe assim no inferno.
MARIA TRANSVIADA (née DE FÁTIMA) É TÁRTARA – Cabe na minha lista porque aqui no morro nunca ninguém debutou tão depressa. Quando está de cara cheia, faz “intripitísi” peladinha. Desenvolve milhões. Tão elegante que já anda tossindo um pouco. Se não sumir, vai longe.
SANTINHA TURCÃO É INTENSA PRA CACHORRO – Mulher-macho, mas VIP. Capaz de chamar atenção em qualquer esquina. Com chuva ou com sol. Falam que é escandalosa, mas é de mágoa. Seu “róbi” é baixar o sarrafo em Cosme e Damião embolados. Também eles são tão pequenininhos! A mais esportiva. Veste a camisa do mais querido. Passou o verão na Penitenciária de Bangu. Grande admiradora de Valdemar Santana. Charme e valentia.
SOFIA LOREN É A QUE MAIS DÁ O DURO – Caixa alta, crânio e legal. Impressionante atividade filantrópica. Vendeu tanto papel que comprou um vestido e dois fogareiros num mês. Também é a mãe do ano: nove bacorinhos barrigudinhos. Rebolou-se, mas conseguiu dar de comer a todos. Só morreu um. Assim mesmo (disse o doutor), foi de intoxicação alimentar. Esquerda positiva. É.
BBB (BENEDITA BOA BOCA, para a imprensa) SUPEROU SUA CONDIÇÃO DE MULHER – Conhecida até em Parada de Lucas. Ajudou o Bom Cabelo enquanto teve força. Foi debutar no céu porque a assistência custou muito a chegar. Foi a mais fechada de 1963. Boto uma falecida na minha lista porque mereceu. Foi enterrada de azul.
MARIA FILHA DE MARIA TEM CULTURA – É a mais bíblia do morro. Não topa cachaça, não topa macumba, não topa navalha. Não olha nem pra cachorro macho. Falam que nunca debutou. Não importa. Entra na minha lista assim mesmo. Politizada. Está com Zarur. Cem por cento do culto.
CLARIMUNDA BRASIL (née SANTA CRUZ) É DO OUTRO MUNDO – Desenvolve extraordinária atividade mediúnica. Aparelho legal. Funciona mais do que transistor. Entra na minha lista porque foi a melhor anfitriã das almas do outro mundo. Ninguém recebe um espírito tão bem feito ela. Perdeu seu barracão no Pasmado, mas já baixou em Bangu-sur-mer. É branca.
EDUVIGES SEGIVUDE NASCEU NO ESTRANGEIRO – Veio de São Paulo, mas é carioca de coração. Foi amiga de Carolina no Tietê. Chique. Tinha televisão, mas o homem veio e tomou. Casada mesmo. É VIP de família. O pai era um troço primitivo. Meio metida a besta. Mas tem direito. Dá-se com Dom Hélder.
JOANA LORCAL COME O ANO INTEIRO – Engorda que faz inveja. Sensibilidade artística. Coleciona objetos antigos jogados em lata de lixo. Extraordinária atuação nos terreiros. Amigou cinco vezes em 63. Estendeu suas atividades até Nova Iguaçu. Já se hospedou num hotel. Brigou com um cara. Levou um trompaço. Ficou danada de exótica com a plástica. Feita no Miguel Couto. É pra valer.
MARLENE FOFOCA É NOME OBRIGATÓRIO – Tem um barraco na Catacumba. Outro de zinco na Praia do Pinto. Não foi para a Cruzada São Sebastião porque faltou um papel. Seu “róbi” é certo colunista social do morro. Nunca faltou feijão em sua casa. Alisa o cabelo três vezes por ano. Entra na lista porque merece. Não é por ser material aqui do papai.
Publicado na revista Manchete em 15/2/64.